Mesmo com uma decisão judicial, a família do idoso com problema no coração, Nery Pires, ainda não conseguiu que ele fizesse a cirurgia de urgência em Goiânia. De acordo com a filha, Izamara Pires, desde maio, seu pai já teve três infartos e já espera pelo procedimento há cerca de 50 dias, tornando o sentimento de apreensão na família cada vez mais forte.
“Estamos de mãos atadas. Meu pai já está desacreditado e tem muito medo de morrer dependendo dessa espera”, lamentou Izamara.
Com a demora, a família de Nery buscou a Justiça no fim de agosto. A liminar foi emitida no último dia 29 e determinou que o estado disponibilizasse um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com uma equipe para a cirurgia necessária, seja na rede pública ou conveniada. O procedimento deveria ter acontecido entre os dias 5 e 6 de setembro, mas foi adiado.
O documento emitido pelo juiz Clauber Costa Abreu diz que, caso não houvesse vagas, o paciente deveria ser encaminhado para a rede particular em um prazo de 12 horas, de modo que o descumprimento da liminar resultaria em uma multa de R$ 10 mil por hora.
A liminar emitida pelo magistrado ainda diz que a não realização do tratamento adequado do paciente pode levar a complicações cardiológicas e causar a morte. Ele ainda ressaltou que a “saúde é um direito de todos e é dever do Estado garantir o [seu] acesso”.
O g1 procurou a Defensoria Pública, que atua no caso a favor de Nery, que afirmou que o órgão tomou todas as todas as providências judiciais e o Estado comunicou que faria o procedimento entre os dias 5 e 6 de setembro.
“Inclusive, a Defensoria pediu o bloqueio de verbas públicas para pagar a cirurgia em hospital particular em caso de novo descumprimento”, explicou a Defensoria.
Ao g1, a Secretaria de Estado de Saúde (SES-GO) informou que competia à pasta somente regular a vaga de UTI ao paciente e pagar pelo serviço a ser feito. Além disso, disse que mantém um plano de trabalho para a execução do implante marca-passo (veja nota completa abaixo).
Quanto ao atraso para o cirurgia, a Santa Casa de Misericórdia de Goiânia e a Secretaria Municipal de Saúde afirmaram que o aparelho necessário ao procedimento foi adquirido pela instituição em São Paulo na última semana e que a previsão é que o equipamento chegue nesta quinta-feira (8). De acordo com o hospital, os materiais deveriam ter sido entregues em quatro dias úteis, mas houve um atraso por parte do fornecedor.
O equipamento em questão é um Cardioversor Desfibrilador Implantável (CDI), que serve para monitorar o ritmo cardíaco 24 horas por dia. Assim, se o coração apresenta alguma alteração, o equipamento envia pequenos sinais elétricos indolores para corrigir o ritmo das batidas.
A SMS ainda informou que o Ministério Público foi informado da compra do equipamento e que também acompanha o caso.
Doença cardíaca
Nery, que tem 72 anos e mora em Bela Vista de Goiás, tem 4 filhos, 14 netos e 2 bisnetas. No momento, toda a família aguarda ansiosa para que ele realize o procedimento e volte para casa sem riscos de sofrer outro infarto. Izamara, a filha mais nova de Nery, explica que seu pai começou a ter problemas cardíacos em maio deste ano, quando sofreu dois infartos. A filha conta que, na época, ele realizou um cateterismo e uma angioplastia.
“No dia que ele foi fazer a última cirurgia, ele sofreu uma parada cardíaca. Uma semana depois ele teve outro infarto e isso gerou a doença que ele tem no coração hoje”, explicou.
Ela conta que o pai desenvolveu uma doença chamada miocardiopatia isquêmica, causada por obstrução nas artérias, grave e que ele precisa colocar o marca-passo específico para o problema dele para evitar novos infartos.
“Os médicos falam que a qualquer momento ele pode ter outro infarto”, diz Izamara.
A família de Nery explica que chegou a realizar o orçamento do procedimento na rede particular de saúde, mas a cirurgia custaria em mais de R$ 65 mil, valor que eles não possuem condições de arcar.
Veja a nota da SES-GO na íntegra:
“A Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO) reitera que o Estado de Goiás cumpre a decisão judicial de disponibilização, pelo Complexo Regulador Estadual (CRE), de leito com equipe para implante do Cardioversor Desfibrilador Implantável (CDI), na rede pública ou conveniada, no prazo definido e com respeito às prioridades dos demais pacientes na mesma condição, conforme avaliado pelo Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário da SES.
A SES ressalta que o SUS é gerido de forma tripartite: União, Estado e Município, e a parte que coube ao Estado foi cumprida. Destaca-se que cabe à SES regular a vaga de UTI ao paciente e pagar pelo serviço a ser feito.
A SES lembra que, imediatamente após a decisão judicial liminar, o paciente foi encaminhado, via Complexo Regulador Estadual (CRE), em 1º de setembro, para a Santa Casa de Misericórdia, onde o paciente se encontra, recebendo assistência e cuidados médicos.
Trata-se do único prestador habilitado a fazer o procedimento, e recebe recursos federais, estaduais e municipais para tal finalidade. A SES mantém com a unidade plano de trabalho para execução de procedimentos cirúrgicos, entre eles o implante CDI, ou marcapasso, que é o caso do paciente.
OBS.: Seguem abaixo roteiro cronológico do caso, com as explicações jurídicas da SES.
Em 19 de agosto, a Defensoria Pública do Estado de Goiás (DEP-GO), assistindo o Senhor Nery Pires, ingressou na Justiça alegando que o paciente se encontrava no Hospital Estadual de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol) e necessitava de vaga de UTI para implante de Cardioversor Desfribilador Implantável (CDI).
No dia seguinte (20/8), o Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário concluiu que os sinais vitais do paciente estavam estáveis, que não se tratava de urgência ou emergência médica e que o procedimento é realizado no SUS.
Dez dias depois do protocolo da ação, em 29/8, a 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual deferiu liminar para que fosse disponibilizado leito de UTI com equipe para implante do CDI na rede pública ou conveniada no prazo de 12 horas e que a decisão não autorizava o poder público a furar fila da regulação do Complexo de Regulação Estadual (CRE). E que, apenas em caso de inexistência de vagas, é que o paciente deveria ser encaminhado a instituição privada de saúde.
A Procuradoria-Geral do Estado recebeu, por e-mail, a comunicação da decisão em 30 de agosto e peticionou nos autos em 2 de setembro informando que havia no cadastro do Complexo de Regulação Estadual em 1º de setembro 36 pacientes aguardando vaga para unidade de cardiologia e que, naquele 1º de setembro, o paciente tinha sido internado na Santa Casa de Misericórdia com programação cirúrgica para implante de CDI para 05 ou 06 de setembro.
Desta forma, a ordem liminar de disponibilização pelo CRE de leito com equipe para implante do CDI na rede pública ou conveniada, no prazo de 12 horas e com respeito às prioridades dos demais pacientes foi devidamente cumprida.
Necessário ressaltar que a ordem de disponibilização de leito apto à realização de cirurgia não impõe, no mesmo prazo, a realização de cirurgia, porque se trata de ato médico e depende de exames e rotinas denominados pré-cirúrgicos para a segurança do próprio paciente.”
Fonte:G1